Emygdio de Barros/Museu de Imagens do Inconsciente
Desenho de Raphael Domingues
Mostra no Instituto
Moreira Salles vê modernidade de esquizofrênicos
FOLHA DE SÃO PAULO
Lá fora a arte moderna
rugia, e também lá dentro. Na virada dos anos 1940 para os 1950,
enquanto o movimento concreto se firmava e o abstracionismo ganhava
terreno, dois internos do Centro Psiquiátrico Nacional, no Engenho
de Dentro, no Rio, sofriam os ecos da revolução.
Raphael Domingues e
Emygdio de Barros, que agora têm uma mostra no Instituto Moreira
Salles, já tinham inclinação para as artes visuais antes de serem
diagnosticados como esquizofrênicos e levados ao hospital comandado
por Nise da Silveira.
No lugar do choque
elétrico, a psiquiatra desenvolveu terapias alternativas, como um
ateliê de arte. Era sua tentativa de encontrar nos desenhos e
pinturas dos internos chaves para entender um estado psíquico
conturbado.
Pintura de Emygdio de
Barros que está exposta no Instituto Moreira Salles, em São Paulo
"Ela buscava a
projeção de imagens do inconsciente", diz Rodrigo Naves, um
dos curadores da mostra. "É como se o inconsciente, com todos
os seus arquétipos, fosse projetado para fora nessas telas."
Mais do que isso. Almir
Mavignier, artista que trabalhou no ateliê como assistente de
Silveira, identificou já nos anos 1940 a modernidade do traço nos
desenhos de Domingues e a intensidade da cor nos trabalhos de Barros.
Enquanto o primeiro se
expressava com desenhos de traço simples, sempre em preto e branco,
o segundo carregava nas tintas reagindo ao que Naves chama de
"relação estridente com o mundo".
Quase autista,
Domingues, que morreu em 1979, não falava e passava o tempo todo
fazendo risquinhos indecifráveis em folhas de papel. Quando
Mavignier começou a levar pessoas e objetos para que ele retratasse,
acabou desencadeando todo um universo visual em sua obra.
"Ele tem essa
sinuosidade da linha e uma continuidade do traço muito forte",
diz Heloísa Espada, também curadora da mostra, sobre o trabalho de
Domingues. "São desenhos feitos de um só fôlego, com grande
equilíbrio e domínio do espaço. Têm uma memória das formas."
No caso, essa memória
instantânea dos contornos permitia ao autor estabelecer um "vínculo
com o mundo real", nas palavras de Espada.
MUNDO ESTILHAÇADO
Tanto ele quanto
Barros, aliás, foram comparados a Matisse pela maleabilidade do
traço e pela intensidade das cores. Mas, no caso de Barros, morto em
1986, há uma espécie de obsessão em retratar muito de perto os
objetos, anulando a distância entre mundo e observador.
Muitas vezes, some o
espaço ao redor e a tela retrata só seu objeto principal, que ocupa
todo o quadro, quase transbordando dele.
"Em Matisse, há
um estilhaçamento do mundo, um confronto que tenta reestruturar o
espaço", diz Naves. "Aqui a questão é outra, é uma
abordagem do mundo sem perspectiva, sem claro-escuro. Barros é
moderno por prescindir disso de uma maneira radical." (silas
martí)
RAPHAEL E EMYGDIO
QUANDO de ter. a sex.,
das 13h às 19h; sáb. e dom., das 13h às 18h; até 7/7
ONDE Instituto Moreira
Salles (r. Piauí, 844, tel. 3825-2560)
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